quarta-feira, 27 de maio de 2015

O Beijo ---- Alexandre O´Neill

O Beijo
Congresso de gaivotas neste céu
Como uma tampa azul cobrindo o Tejo.
Querela de aves, pios, escarcéu.
Ainda palpitante voa um beijo.
Donde teria vindo! (Não é meu...)
De algum quarto perdido no desejo?
De algum jovem amor que recebeu
Mandado de captura ou de despejo?
É uma ave estranha: colorida,
Vai batendo como a própria vida,
Um coração vermelho pelo ar.
E é a força sem fim de duas bocas,
De duas bocas que se juntam, loucas!
De inveja as gaivotas a gritar...
Alexandre O´Neill

terça-feira, 26 de maio de 2015

Alexandre O' Neill Há palavras que nos beijam

Há palavras que nos beijam 
Como se tivessem boca. 
Palavras de amor, de esperança, 
De imenso amor, de esperança louca. 

Palavras nuas que beijas 
Quando a noite perde o rosto; 
Palavras que se recusam 
Aos muros do teu desgosto. 

De repente coloridas 
Entre palavras sem cor, 
Esperadas inesperadas 
Como a poesia ou o amor. 

(O nome de quem se ama 
Letra a letra revelado 
No mármore distraído 
No papel abandonado) 

Palavras que nos transportam 
Aonde a noite é mais forte, 
Ao silêncio dos amantes 

Alexandre O´Neill

domingo, 24 de maio de 2015

"Manter-me ligada à vida" --- maria josé franca

"Manter-me ligada à Vida que irrompe à minha volta. Permitir que a felicidade me inunde e caminhar em direção a braços que se abrem. Pedir à Vida mais Vida."       Maria José Franca

Renoir ---Baile do Moulin de la Galette


bAILE do MOULIN de LA GALETTE

Primeiro baile de uma vida
(…)
Isto já faz muito tempo, mas não parece.
Ainda a vejo naquela mesa escondendo as mãos.
Foi um encontro marcado por algo maior.
Nas asperezas das mãos, a maciez do amor.
Eu, que sequer sabia dançar, valsei com ela.
Foi capaz de me conduzir à vida plena de sonhos.
Foi naquele baile, nosso primeiro, que de facto, renascemos.
Jossan Karsten/Escritor
- Baile no Moulin de la Galette, de Pierre-Auguste Renoir, é uma pintura do século XIX que pode ser encontrada no charmoso Museu d'Orsay, em Paris. Uma das primeiras obras-primas do Impressionismo

sexta-feira, 22 de maio de 2015

sOLIDÃO f. bUARQUE DA hOLANDA

Solidão não é a falta de gente para conversar, namorar, passear ou fazer sexo... Isto é carência.
Solidão não é o sentimento que experimentamos pela ausência de entes queridos que não podem mais voltar... Isto é saudade.
Solidão não é o retiro voluntário que a gente se impõe, às vezes, para realinhar os pensamentos... Isto é equilíbrio.
Solidão não é o claustro involuntário que o destino nos impõe compulsoriamente para que revejamos a nossa vida... Isto é um princípio da natureza.
Solidão não é o vazio de gente ao nosso lado... Isto é circunstância.
Solidão é muito mais do que isto.
Solidão é quando nos perdemos de nós mesmos e procuramos em vão pela nossa alma....
Francisco Buarque de Holanda

o melro ---Guerra Junqueiro

O MELRO
O melro, eu conheci-o:
Era negro, vibrante, luzidio,
Madrugador, jovial;
Logo de manhã cedo
Começava a soltar d'entre o arvoredo
Verdadeiras risadas de cristal.
E assim que o padre cura abria a porta
Que dá para o passal,
Repicando umas finas ironias,
O melro d'entre a horta
Dizia-lhe: «Bons dias!»
E o velho padre cura
Não gostava daquelas cortesias.
(…)
Guerra Junqueiro

terça-feira, 19 de maio de 2015

Poema de Teresa BALTÉ ----trouxeste-me o deserto

Trouxeste-me o deserto
fiquei a duna depois do vento
atenta ao silêncio
trouxeste-me o absoluto
o que dura por metáforas
de timbre e cores várias
trouxeste-me o inverso
mas igualmente intenso
ou tão surpreende
equilíbrio do extremo
a vida divisou-nos
guardámos as visões
tERESA bALTÉ

terça-feira, 12 de maio de 2015

E por vezes David Mourão Ferreira ---- E por vezes

E por vezes as noites duram meses 
E por vezes os meses oceanos 
E por vezes os braços que apertamos 
nunca mais são os mesmos    E por vezes 

encontramos de nós em poucos meses 
o que a noite nos fez em muitos anos 
E por vezes fingimos que lembramos 
E por vezes lembramos que por vezes 

ao tomarmos o gosto aos oceanos 
só o sarro das noites      não dos meses 
lá no fundo dos copos encontramos 

E por vezes sorrimos ou choramos 
E por vezes por vezes ah por vezes 
num segundo se evolam tantos anos