segunda-feira, 30 de outubro de 2017

MIA COUTO ---- A FLOR QUE ÉS

 FLOR QUE ÉS
A flor que és,
não a que possa comprar,
te venho oferecer.
Porque não tem preço
o que te ofereço.
E se me debruço a colher a pétala,
a terra inteira em teus dedos se desfolha.
E se a mais pura flor para ti desenho
a inteira pétala no nada se despenha.
Porque és a sombra do sonho em que anoiteço.
Morrer é ter terra finita.
E eu tenho a febre da inatingível margem.
Por isso encho de mar o teu olhar.
MIA COUTO

SOPHIA de MELLO BREYNER ANDRESEN----- ------ AS ROSAS

AS ROSAS
Quando à noite desfolho e trinco as rosas
É como se prendesse entre os meus dentes
Todo o luar das noites transparentes,
Todo o fulgor das tardes luminosas,
O vento bailador das Primaveras,
A doçura amarga dos poentes,
E a exaltação de todas as espera       

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

CARLOS FRANQUINHO --- o PINHAL DO REI NÃO MORRE

"Amigos: o Pinhal do Rei não morreu como apregoam alguns. O Pinhal do Rei não são os pinheiros que o compõem. É muito mais que isso: são 700 anos de história, são memórias, são as dunas brancas, são as urzes, as camarinhas e os medronhos, são as nossas memórias e os passeios. Nada disso arde."


   CARLOS FRANQUINHO

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Afonso Lopes Vieira Pinhal do REI.... Catedral VERDE e SUSSURRANTE

PINHAL DO REI
Catedral verde e sussurrante, aonde
a luz se ameiga e se esconde
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar:
ditoso o "Lavrador" que a seu contento
por suas mãos semeou este jardim;
ditoso o Poeta que lançou ao vento
esta canção sem fim...
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
rei D. Dinis, bom poeta e mau marido,
lá vem as velidas bailar e cantar.
Encantado jardim da minha infância,
aonde a minh'alma aprendeu;
a música do Longe e o ritmo da Distância
que a tua voz marítima lhe deu;
místico órgão cujo além se esfuma
no além do Oceano, e onde a maresia
ameiga e dissolve em bruma,
e em penumbra de nave, a luz do dia.
Por estes fundos claustros gemem
os ais do Velho do Restelo...
Mas tu debruças-te no mar e, ao vê-lo,
teus velhos troncos de saudades fremem...
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal louvado,
são as caravelas, teu corpo cortado,
é lo verde pino no mar a boiar.
Pinhal de heróicas árvores tão belas,
foi do teu corpo e da tua alma também
que nasceram as nossas caravelas
ansiosas de todo o Além;
foste tu que lhe deste a tua carne em flor
e sobre os mares andaste navegando,
rodeando a terra e olhando os novos astros,
ó gótico Pinhal navegador,
em naus, erguida, levando
tua alma em flor na ponta alta dos mastros!...
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que vedes no mar?
Ai flores, ai flores do Pinhal florido,
que grande saudade, que longo gemido
ondeia nos ramos, suspira no ar!
Na sussurrante e verde catedral
oiço rezar a alma de Portugal:
ela aí vem, dorida, e nos seus olhos
sonâmbulos de surda ansiedade,
no roxo da tardinha,
abre a flor da Saudade;
ela aí vem, sozinha,
dorida do naufrágio e dos escolhos,
viúva de seus bens
e pálida de amor,
arribada de todos os aléns
de este mundo de dor;
ela aí vem, sozinha,
e reza a ladainha
na sussurrante catedral aonde
toda se espalha e esconde,
e aonde, ecoando a cantar,
se alonga e se prolonga a longa voz do mar.
Afonso Lopes Vieira

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Carlos Pires .... Quero dizer-te coisas...

Quero dizer-te coisas
com palavras
que ainda não conheças
e nelas a tua vida caiba
numa flor nunca vista
ou numa ave secreta e rara
com letras desconhecidas

....
in "O Livro das Pequenas Orações" de Carlos Lopes Pires

terça-feira, 3 de outubro de 2017

FLORBELA ESPANCA --- SE TU viesses ver-me hoje à tardinha...


SE TU VIESSES VER-ME HOJE À TARDINHA.....
.Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,
A essa hora dos mágicos cansaços,
Quando a noite de manso se avizinha, 
E me prendesses toda nos teus braços...
Quando me lembra: esse sabor que tinha
A tua boca... o eco dos teus passos...
O teu riso de fonte... os teus abraços...
Os teus beijos... a tua mão na minha...
Se tu viesses quando, linda e louca,
Traça as linhas dulcíssimas dum beijo
E é de seda vermelha e canta e ri
E é como um cravo ao sol a minha boca...
Quando os olhos se me cerram de desejo...
E os meus braços se estendem para ti...
Florbela Espanca, in "Charneca em Flor