domingo, 25 de fevereiro de 2018

ALEXANDRE O`NEILL --- SEI OS TEUS SEIOS

Sei os teus seios. 
Sei-os de cor. 

Para a frente, para cima, 
Despontam, alegres, os teus seios. 

Vitoriosos já, 
Mas não ainda triunfais. 

Quem comparou os seios que são teus 
(Banal imagem) a colinas! 

Com donaire avançam os teus seios, 
Ó minha embarcação! 

Porque não há 
Padarias que em vez de pão nos dêem seios 
Logo p'la manhã? 

Quantas vezes 
Interrogaste, ao espelho, os seios? 

Tão tolos os teus seios! Toda a noite 
Com inveja um do outro, toda a santa 
Noite! 

Quantos seios ficaram por amar? 

Seios pasmados, seios lorpas, seios 
Como barrigas de glutões! 

Seios decrépitos e no entanto belos 
Como o que já viveu e fez viver! 

Seios inacessíveis e tão altos 
Como um orgulho que há-de rebentar 
Em deseperadas, quarentonas lágrimas... 

Seios fortes como os da Liberdade 
-Delacroix-guiando o Povo. 

Seios que vão à escola p'ra de lá saírem 
Direitinhos p'ra casa... 

Seios que deram o bom leite da vida 
A vorazes filhos alheios! 

Diz-se rijo dum seio que, vencido, 
Acaba por vencer... 

O amor excessivo dum poeta: 
"E hei-de mandar fazer um almanaque 
da pele encadernado do teu seio"
(Gomes Leal)

Retirar-me para uns seios que me esperam 
Há tantos anos, fielmente, na província! 

Arrulho de pequenos seios 
No peitoril de uma janela 
Aberta sobre a vida. 

Botas, botirrafas 
Pisando tudo, até os seios 
Em que o amor se exalta e robustece! 

Seios adivinhados, entrevistos, 
Jamais possuídos, sempre desejados! 

"Oculta, pois, oculta esses objectos 
Altares onde fazem sacrifícios 
Quantos os vêem com olhos indiscretos" 
(Abade de Jazente)

Raimundo Lúlio, a mulher casada 
Que cortejaste, que perseguiste
Até entrares, a cavalo, p'la igreja 
Onde fora rezar, 
Mudou-te a vida quando te mostrou 
("É isto que amas?") 
De repente a podridão do seio. 

Raparigas dos limões a oferecerem 
Fruta mais atrevida: inesperados seios... 

Uma roda de velhos seios despeitados, 
Rabujando, 
A pretexto de chá... 

Engolfo-me num seio até perder 
Memória de quem sou... 

Quantos seios devorou a guerra, quantos, 
Depressa ou devagar, roubou à vida, 
À alegria, ao amor e às gulosas 
Bocas dos miúdos! 

Pouso a cabeça no teu seio 
E nenhum desejo me estremece a carne. 

Vejo os teus seios, absortos 
Sobre um pequeno ser
alexandre o`neill



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